CÉU CLARO
O cavalo da noite galopa nas luzes da rua
em todo canto o som triste
sento-me na esquina dos séculos
xícara de café: um estádio
um jogo de futebol
torcedores pulam como corvos
rumores de falhas
como o sol da manhã
senil em ascensão
elevo-me para outro andar
sábios tocam tambores nas nuvens
um barco remenda o mar
por favor enlace este momento no horizonte
deixe o milho e as estrelas se entrelaçarem
os desesperados braços de Deus
giram na face de um relógio
Bei Dao
SIM
Neste lugar, um sonho desabou.
E fiz florescer o meu pasto de iras
contra ninguém.
Neste lugar, meus dilemas
me abocanharam
e ouvi gargalhadas que eram punhais.
Neste lugar, me perdi.
E nada pedi a mim mesmo
para encontrar-me.
Deixei que as feras viessem
do meu avesso
e se perdessem de vista em minha carne
Roberval Pereyr
ASA DE CORVO
Asa de corvos carniceiros, asa
De mau agouro que, nos doze meses,
Cobre às vezes o espaço e cobre às vezes
O telhado de nossa própria casa…
Perseguido por todos os reveses,
É meu destino viver junto a essa asa,
Como cinza que vive junto à brasa,
Como os Goncourts, como os irmãos siameses!
É com essa asa que eu faço este soneto
E a indústria humana faz o pano preto
Que as famílias de luto martiriza…
É ainda com essa asa extraordinária
Que a morte – a costureira funerária –
Cose para o homem a última camisa!
Augusto dos Anjos